quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Contaminação, evolução, mudança: 2ª parte


Continuando a conversa
sobre “contaminação”, “evolução”, “mudança” e afins, que comecei com o Danilo Nogueira através dos nossos blogs , fui revisar alguns conceitos, e vou tentar reorganizar as ideias para chegar, de novo, no meu ponto de partida e no que eu quero realmente explorar.
Primeiro: as línguas evoluem. Sim. Mas vou puxar o meu passado de bióloga e tomar a palavra evolução como processo de transformação e modificação ao longo do tempo. Essa é a definição de evolução no sentido biológico, e a rigor, não é nem positiva e nem negativa. É mudança, simplesmente.
Portanto, as línguas mudam, se transformam, e disso nós somos testemunhas, já que o vocabulário e modo de falar denuncia a idade, não é?
Segundo: se as línguas mudam, como isso acontece?
Um dos modos de mudança lexical (existem vários) é o empréstimo, que ocorre quando há incorporação ao léxico de uma língua de uma palavra ou traço linguístico pertencente a outra língua. No empréstimo pode haver a reprodução da palavra sem alteração na pronúncia ou grafia (como em shopping), ou com adaptação fonológica e ortográfica (como em abajur).
Como a língua não muda mesmo aos trambolhões (embora alguns processos atraiam outros e ocorram quase em sequência), o mais interessante é que, se a gente prestar atenção, pode observar essas mudanças acontecendo diante dos nossos olhos (e ouvidos).
Esses dias eu estava vendo uma propaganda em homenagem ao Pelé, que hoje faz 70 anos, e a propaganda mostrava um recorte de jornal bem antigo, e lá estava escrito que o Pelé tinha levado um “knockout”. Muitos anos depois, essa palavra estrangeira não gerou apenas mais uma palavra completamente incorporada ao nosso léxico, mas uma família inteira: nocautear, nocauteado, nocauteador, nocaute e por aí vai. São legítimas, sim, mesmo que o dicionário não consagre todas elas (no Houaiss, por exemplo, não há nocauteador).
Você observou a palavra que eu usei, “consagre”? Não foi à toa. Isso porque o dicionário sempre foi uma obra absoluta, como a bíblia, para muitos. Em reuniões de família, levanta-se da mesa para consultar o dicionário, e o que ele diz é lei.
Os neologismos, porém, demoram em média dez anos para constarem nos dicionários, com raras e boas exceções, como o Aulete, pois nesses tempos internéticos, dez anos é muito tempo.
Antes de constarem no dicionário, as palavras têm que passar por um período de “teste”, e aí entra muito (mas muito mesmo), a questão do poder, quem disse, quem está usando tal palavra ou expressão, para ver se a palavra vai “vingar”. Mas nós, simples mortais e não “imortais” da academia, também temos a nossa parcela de influência, ao falarmos e escrevermos, estamos legitimando palavras e construções.
Língua é poder, palavra é poder. Por isso temos tantas palavras oriundas do inglês, adaptadas ou não. São eles que mandam agora, já foram os romanos.
A questão que mais choca, porém, não é o empréstimo lexical, mas a incorporação de estruturas sintáticas ao português, a que nós, tradutores, estamos mais expostos e das quais muitas vezes somos a causa.
Mas esse vai ser o assunto do próximo post. Enquanto isso, leia essa tirinha da Mafalda, boa para se divertir e refletir. Até lá.

     

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